De Turfe um pouco..., por Mário Rozano
E ASSIM NASCEU O BENTO GONÇALVES...
Em 14 de novembro de 1909, os cavalos Aguapehy, Aliança, Wisdon, Condor, Hermit II e Ouvidor, alinharam diante do partidor dos 2.100 metros da pista do Hipódromo do Menino Deus como postulantes ao 1º Grande Prêmio Bento Gonçalves, instituído no mesmo ano, pela Associação Protectora do Turf, então dirigida pelo Coronel Antônio Pedro Caminha. O turfe prestava uma homenagem ao General Bento Gonçalves, principal líder republicano da Revolução Farroupilha e presidente da República Rio-Grandense.
A Associação Protectora do Turf, fundada em setembro de 1907, após os primeiros anos de prosperidade, não escapou da crise que se instalou nos meio turfísticos. O Coronel Affonso Emilio Massot, patrono e ex-Comandante da Brigada Militar, nome sempre ligado à vida do turfe porto-alegrense por sua credibilidade, foi incumbido de resgatar e organizar a Protectora e concluiu que, sem ajuda do Estado, seria inviável seu ressurgimento e declinou da missão, provocando a ida de dois dirigentes da entidade J.J.da Silva Azevedo e Edmundo Gonçalves de Carvalho a procurarem o então Chefe de Polícia, Vasco Pinto Bandeira, que convocou o Cel. Caminha para a difícil tarefa.
Aceito o desafio, sua primeira iniciativa foi a de procurar o Presidente do Estado, Carlos Barboza Gonçalves – seu correligionário de partido republicano -, e o Intendente (prefeito) de Porto Alegre, José Montaury. Com eles e o Chefe de Polícia Vasco Pinto Bandeira, formaram a “abnegada trindade”, esteio da administração de Caminha. Compareciam a todas as reuniões e auxiliavam com dotações aprovadas em leis para incrementar o desenvolvimento do esporte e da criação do cavalo puro-sangue.
De personalidade forjada dentro dos mais rígidos padrões militares, avesso a bajulações, o Cel. Caminha enfrentou a situação com poderes ditatoriais, porém com justiça e sobriedade. Rompeu relações e amizades antigas quando não vinham ao encontro dos interesses da Protectora. Suas ações decisivas impulsionaram o turfe; entre elas o apoio as exposições de potros, a instituição de grandes páreos.
E assim surgiu na gestão do Coronel Caminha o maior prêmio do turfe gaúcho, o Grande Páreo Bento Gonçalves, com a dotação concedida pelo Governo do Estado na ordem de 3:450$000 (3 contos e quatrocentos e cinquenta mil de réis) ao vencedor do páreo.
Auxilio esse que foi instituído pela Lei nº 94 de 30/11/1909, no qual era criado um imposto de 2% sobre as “poules”, e destinado ao custeio de três grandes prêmios, 14 de Julho, Rio Grande do Sul e Bento Gonçalves, e ao fomento da criação do cavalo puro-sangue. A Lei nº 94 foi sancionada e teve execução legal em 14 de abril de 1914, conforme Decreto nº 2081, na gestão de Borges de Medeiros e de seu Secretario da Fazenda, Otavio Rocha. Ao Estado cabia o percentual de 10% do imposto a título de administração.
A realização do “Bento” em 1909 foi considerada como o grande evento do ano na Porto Alegre de 100 mil habitantes e dois hipódromos, e a maior vitória da Associação Protectora do Turf, conforme ressaltou a imprensa na coluna “Sports”, dos jornais A Federação e Correio do Povo. A disputa da magna prova atraiu a presença de uma verdadeira “multidão” ao Prado Rio-Grandense no Menino Deus, “tornando difícil o transito” no local, noticiou A Federação.
A crônica não registra o número de “poules” jogadas em cada um dos competidores, entretanto deixa claro que Aguapehy , um tostado filho de Express, nascido no Uruguai, onde cumpriu excelente campanha na pista do Hipódromo Nacional de Maroñas com o nome de Chaparrón, foi escolhido favorito da contenda (dividendo de 6$10). Fazendo jus a confiança que a maioria dos apostadores lhe depositou, mesmo deslocando 60 quilos, Aguaphey venceu por diferença de dois corpos o primeiro Grande Páreo Bento Gonçalves.
Devido à indocilidade dos competidores diante da fita de largada provocada pelo animal Aliança, o juiz de saída e diretor da Protectora, Sr. Martins Minaberry Junior, anulou a largada por várias vezes. Como era de se esperar, Aliança ficou “sentado e fora do páreo” no momento do sino definitivo.
Interessante destacar que há 102 anos, a Protectora do Turf, preocupada com a lisura e os delitos de pista e do interior dos dois hipódromos existentes, determinava a presença de juízes específicos - todos eles diretores da entidade e de relevância na sociedade gaúcha -, para todas as etapas das provas como: Saída: Martins Minaberry Junior; De chegada: Tentente-Coronel Affonso Massot, Coronel Saturnino Mathias Velho e Jorge Carvalho; De percurso: Elysio Feijó, Norberto Villas Boas e Arthur Bardou; De pesagem: Jacinto Henriques e de Arquibancadas: José Olympio de Souza, Henrique Gonçalves e Fernando Brochado.
Levantada a fina tomou a dianteira o potro Condor e assim comandou o lote na primeira volta, seguido por Hermit II, Ouvidor, Wisdon e Aguapehy que corriam próximos na expectativa. Na altura dos 1.000 metros, Ouvidor sentido, desertou da carreira, enquanto em rápidos galões Hermit II desalojava Condor da liderança, com Aguapehy e Wisdon em sua águas. Ao passarem a baliza dos 1.600, a prova começava a ser decidida em favor do tostado Oriental, que assumiu a vanguarda dando sinais que são mais alcançado por sua escolta Wisdon em espetacular performance. Trazido na ponta dos dedos e com estilo seu piloto, Aguapehy cruzou a sentença final com 2 corpos de vantagem sobre Wisdon, que por sua vez abriu 4 corpos do promissor “potrillo” Condor. Ouvidor que mancou, não concluiu o percurso.
O vencedor Aguapehy, 6 anos, oriundo do Uruguai, filho de Express e Torpedera por Kimbolton, de propriedade do turfman Ezequiel Ubatuba da firma Paixão & Lima, era treinado pelo – já naquela época - lendário entraineur Paulo Rosa, titular da Coudelaria Araphey, instalada no “distante” arrabalde da Praia de Belas, zona sul de Porto Alegre. O tempo percorrido pelo vencedor sob a monta do experiente jinete Adalberto Soares, foi de 2m37s 2/5 para os 2.100 metros em pista de areia normal.
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