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domingo, 24 de outubro de 2010
JOCKEY CLUB BRASILEIRO VERSUS ESPECULAÇÃO IMOBILIÁRIA III
Carta aberta a Câmara Municipal da cidade do Rio de Janeiro
Ilustres Vereadoras e Vereadores da nossa cidade
Foi com muita esperança no futuro do JCB e, sobretudo na classe política, que recebi cópia do Projeto de Lei de número 734/2010, de autoria do ilustre Vereador Carlo Caiado, que propõe o Tombamento da área denominada Vilas Hípicas, que hoje se encontra em flagrante perigo, ameaçada de morte pela fome pretérita da especulação imobiliária.
Venho aqui, através dessa importante tribuna, apresentar uma exposição de motivos contrários a um desastroso projeto denominado “Boulevard” que está sendo arquitetado para tomar de assalto a moradia dos cavalos, destruindo uma instituição centenária, parte significativa da história da nossa cidade.
Porque sou contra essa barbaridade - O jogo dos dez erros
Sou contra, em primeiro lugar, porque ninguém, em sã consciência, poderia dispor das cocheiras de um clube hípico e ficar com o ônus das pistas e tribunas já tombadas, seria um contra-senso muito grande, um dos maiores escândalos que se poderia ter notícia. É como se alguém concordasse em vender a cozinha, ficando obrigado a manter o salão do restaurante. O “presidente” do JCB poderia ser comparado também a um padre, caso existisse um que convocasse os fiéis para anunciar a alienação do altar, jurando ser a única forma de salvar o cristianismo, como tenta defender o “presidente” do JCB.
Sou contra, em segundo lugar, porque seria um crime sem tamanho demolir um dos maiores sítios arquitetônicos da nossa cidade, projetado e desenhado ainda no final do século dezenove, completamente abandonado e desprotegido da fúria ruinosa dos tratores, e que hoje abriga os animais indispensáveis para a formação dos programas semanais do hipódromo, sem os quais a atividade de turfe padeceria subitamente.
Sou contra, em terceiro lugar, porque justamente colocaria em risco um segmento que gera mais de 15.000 empregos no Brasil, e que há muito tempo já apresentara resultados significativos para o país, sendo que recentemente um cavalo criado em terras brasileiras, defendendo as cores de um stud da cidade do Rio de Janeiro, ganhara o maior prêmio já ofertado no mundo em todos os tempos: Uma bolsa milionária de Dez Milhões de Dólares Norte Americanos!
Sou contra, em quarto lugar, porque esse projeto fatalmente destruiria a vida de centenas de profissionais do turfe que residem naquelas bucólicas Vilas Hípicas há mais de oitenta anos com suas famílias, trabalhando honestamente e torcendo apenas para que o clube encontre uma administração responsável para poder retornar aos seus dias de glória. Seria uma injustiça sem precedentes despejar todas essas pessoas que dedicaram as suas vidas por uma das atividades mais tradicionais da nossa cidade, um dos segmentos econômicos de maior destaque no mundo, entre as 12 economias dos Estados Unidos da América.
Sou contra, em quinto lugar, porque os moradores da zona sul da cidade do Rio de Janeiro, na confluência do já complicado acesso à Barra da Tijuca e demais bairros próximos ao clube, não suportam mais os engarrafamentos crescentes. Pelos números apresentados no desastroso projeto, milhares de automóveis estariam entrando e saindo de um lugar onde hoje, nem sequer um só cavalo os incomoda.
Sou contra em sexto lugar, porque ninguém, poderia abrir mão de uma das únicas áreas preservadas; um dos poucos pulmões existentes na zona sul da cidade, como é o caso do Jardim Botânico, do Parque Lages e do Parque da Cidade. As Vilas Hípicas, embora mal tratadas criminosa e propositalmente, são guarnecidas por árvores raras, num meio ambiente repleto de verde, composto de 124 mil metros quadrados.
Sou contra em sétimo lugar, porque para se aprovar um projeto com esse naipe de conflitos com as normas vigentes, exigiria uma intervenção radical na legislação de vários bairros, alterando zoneamentos e modificando o atual Plano Diretor da cidade, abrindo precedentes legais para que diversos outros empreendimentos comerciais fossem reivindicados e aprovados em outras áreas relevantes, colocando em perigo todos os bairros bucólicos da zona sul da cidade.
Sou contra em oitavo lugar, porque junto com as Vilas Hípicas, estaria sendo demolido de forma criminosa, o Hospital Octávio Dupont - referência internacional - que além da sua vital importância para a equideocultura brasileira, é um dos pilares para as universidades; tradicional expoente na formação da medicina veterinária no Estado do Rio de Janeiro.
Sou contra em nono lugar, Porque só o movimento de terra para implantar uma garagem subterrânea prevista para 2.500 automóveis, e a remoção de milhares de metros cúbicos advindos dos escombros das vilas, por si só, provocariam uma sujeira sem precedentes na história urbana da nossa cidade, exigindo um transito constante de milhares de caminhões basculantes, da Lagoa Rodrigo de Freitas à zona oeste, durante, pelo menos, seis anos de obras já anunciadas.
Sou contra, em décimo lugar, porque esse plano de demolir as cocheiras, blindado por um descabido acordo de confidencialidade, foi decidido sem nenhuma concorrência, sem que se conhecesse qualquer outra proposta financeira, nem sequer uma, das muitas, das dezenas, talvez centenas de construtoras e empreendedoras aptas a realizar esse projeto, espalhadas pelo Brasil afora, e que sequer foram consultadas.
Uma proposta indecente
Mesmo não sendo matéria do Poder Executivo, para que todos tenham uma noção do tamanho do absurdo, o “presidente” do clube aprovou uma equação em que o clube ficaria durante 45 anos (após a amortização dos custos da obra) com apenas 12,5% dos benefícios do seu próprio terreno, uma das áreas mais valorizadas do país, enquanto 87,5% dos lucros, mais de Cinco Bilhões de Reais, seriam entregues (de mão beijada) nas mãos de uma conhecida empreiteira nacional.
Um importante e decisivo apelo
Infelizmente o clube elegera um “presidente” que não possui nenhum vínculo com o turfe e tão pouco demonstra ter qualquer respeito pela cidade, produto que foi desse fenômeno da política moderna, algoz da democracia, que atende pelo nome de “transferência de votos”, e que aqui vem, dia a dia, se aproveitando de um Estatuto antigo para saciar a sede intolerante de um poder monocrático.
Esse mesmo dirigente luta, há mais de dois anos, aliado a uma empresa estrangeira do mundo do jogo (escolhida novamente sem qualquer disputa comercial) no sentido de obter aprovação em Brasília para instalação imediata de um mar de máquinas eletrônicas ao longo da Rua Jardim Botânico, tentando utilizar perversamente, a Carta Patente de propriedade do clube, descaracterizando a própria Lei do Turfe, promulgada para fomentar a criação de cavalos e não para financiar a guerra dos caça-níqueis.
Vivêssemos nós em uma República Federativa que não fosse uma ficção jurídica, não estaríamos hoje a mercê de uma barbaridade dessas, diante de um senhor chamado Luis Eduardo da Costa Carvalho, que pretende, num só golpe, transformar a nossa história, o bem estar de toda a vizinhança, e a vida de uma instituição centenária, num amontoado de paredes de concreto a serviço da ganância desenfreada do capitalismo.
Tombamento das Vilas Hípicas já!
Peço, portanto aos ilustres vereadores e vereadoras dessa nobre Casa de Leis, guardiã dos nossos direitos, que digam NÃO a esse ato covarde e especulativo, que investe contra a transparência; o bom senso; o patrimônio histórico; os milhares de empregos; as famílias dos profissionais; a mãe natureza; e também o ir e vir na imensa cercania do Hipódromo da Gávea, cartão postal da cidade do Rio de Janeiro.
Jéssica Dannemann, 23 anos, criadora e proprietária de cavalos de corrida
Artigo publicado na Revista Veja desta semana
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